Efetividade promocional da Visitação Médica
Introdução
Para decisões sobre alocação de investimentos, e tendo em vista os custos da visitação médica, é fundamental saber o quanto (e de que forma) esse modelo promocional de fato impacta prescrição e adoção terapêutica em condições reais de mercado.
A questão central é transformar uma prática consolidada em uma alavanca mensurável de crescimento, sempre considerada sua atuação com base em conformidade, e foco em conteúdo de qualidade.
Na prática, isso significa avaliar se o contato promocional (presencial ou remoto), suportado por materiais técnicos pertinentes, altera o comportamento de prescrição e em que contextos esse efeito se torna efetivamente relevante.
A literatura recente reforça que a decisão de prescrever é multifatorial, combinando fatores de natureza variada. A visitação promocional, em particular, situa-se no nível organizacional e de canal, e interage com a reputação do laboratório, nível de evidência clínica, diretrizes e, obviamente, preferências do médico.
Revisões atualizadas posicionam a visita entre os fatores que realmente influenciam a prescrição. Apesar da magnitude dessa influência ser reportada como “variável”, assim como os métodos que a mensuraram, esse conjunto de achados certamente pode ajudar executivos que precisam calibrar frequência, priorizar e decidir sobre a inclusão de conteúdo digital e demais materiais de suporte à visita promocional.
Do ponto de vista estratégico, três frentes se destacam.
1. Impacto do tempo e da prioridade de cada marca por médico, especialmente em lançamentos, quando a elasticidade à visita tende a ser maior.
2. Definição de conteúdo e desenho da interação, já que visitas com uso de material digital têm sido associadas a maiores taxas de início de tratamento para novos pacientes.
3. Orquestração omnichannel, em que e-mails, apresentações digitais, disponibilização de dados e outros, reforçam a visita presencial, potencializando seus efeitos.
Considerar esses fatores implica em migrar de uma lógica de volume para uma lógica de valor por visita, com segmentação preditiva, conteúdo relevante e mensuração rigorosa da efetividade do contato.
Situações nas quais emergiram restrições ao contato direto com os médicos, com subsequente queda nas prescrições das marcas e classes promovidas já atestam a efetividade da visita promocional. Em outras palavras, confirmam seu “papel causal”.
O desafio está em combinar evidências científicas (conteúdo), dados de CRM e potencial de prescrição dos médicos (segmentação) para isolar o efeito incremental das melhores combinações desses fatores, transformando o aprendizado gerado em diretrizes que maximizem retorno e minimizem desgaste de relacionamento.
Metodologia
Visando suporte a decisões executivas relacionadas ao tema, realizamos uma revisão integrativa da literatura com foco em efetividade promocional da visitação médica, sempre em condições alinhadas à conformidade local.
Incluímos revisões e meta-análises recentes, estudos observacionais e quase-experimentais, pesquisas com médicos, estudos qualitativos e relatórios de mercado reconhecidos. Assim, foram incluídas evidências sobre impacto de visitas na prescrição, adoção terapêutica ou intenção de prescrever.
Foram excluídas fontes opinativas sem base empírica, estudos centrados em benefícios indevidos e literatura anterior sem aplicabilidade atual.
A síntese envolve 15 fontes descritas ao final desse artigo, com resumos estruturados e indicações de métricas, populações e relevância executiva, incluindo bases operacionais de mensuração amplamente usadas pelo setor.
A análise foi temática, agrupando achados por constructos de efeito, alavancas operacionais, desenho de canal, papel informacional, governança e mensuração, visando a tradução das evidências em implicações práticas e recomendações táticas.
Resultados
Para decisões de priorização e orçamento de visitação, os achados convergem para seis eixos práticos.
1) Efeito sobre prescrição e adoção.
Revisões recentes organizam determinantes de prescrição em níveis e incluem a visitação como fator de nível intermediário. Embora a heterogeneidade metodológica impeça um único tamanho de efeito, a visita aparece consistentemente entre os drivers monitorados por estudos de políticas e comportamento de prescrição. Em análise quase-experimental em centros acadêmicos nos Estados Unidos, políticas que restringiram o contato direto de representantes com médicos levaram a reduções mensuráveis de prescrição. A inferência é direta: quando o canal é restringido, a classe alvo perde tração, sugerindo que a visita promocional, centrada em ciência, tem efeito positivo quando existente, e efeito negativo quando ausente por restrição. [1,4]
2) Alavancas operacionais: prioridade e tempo.
Em estudos de campo com médicos e representantes, a prioridade atribuída à marca e o tempo da visita promocional foram medidas para avaliar o efeito (prescrição) de uma marca nova ou estabelecida. Com definição adequada desses fatores, marcas novas superaram as estabelecidas. Isso confirma que o valor de uma visita não é binário. Ele depende da qualidade do contato, do tempo dedicado à mensagem certa, e da disciplina de priorização. Em lançamentos, alocar mais tempo e atenção na sua abordagem aumenta a probabilidade de conversão. [3]
3) Conteúdo e uso de material digital[1].
Dados operacionais de gestão de relacionamento (CRM) de grande escala mostram que visitas nas quais o representante utiliza conteúdo digital técnico durante a interação geram aproximadamente 2,5 vezes mais início de tratamento para novos pacientes, comparativamente a visitas sem esse tipo de conteúdo. Na prática, isso posiciona o conteúdo como covariável crítica na efetividade da visita. O recado é claro: treinar a equipe para usar materiais aprovados e relevantes, no momento certo, melhora o desempenho por chamada e acelera a adoção. [5,11]
4) Canais: presencial e remoto.
A apresentação digital síncrona ao médico, também chamada de apresentação remota ou e-detailing, igualou ou superou o presencial em intenção de prescrever em vários mercados da Europa, Oriente Médio e África, com exceções pontuais. Essa evidência é consistente com painéis que mostram preferência por um modelo híbrido, combinando contato presencial para tópicos complexos com interações remotas mais ágeis para reforço de mensagens. Do ponto de vista estratégico, o gestor pode redesenhar o mix para reduzir custo por contato sem perder efetividade, aumentando alcance junto a médicos de mais difícil acesso. [6,12,14]
5) Papel informacional e aceitação pelos médicos.
Pesquisas com médicos indicam que aproximadamente metade relata impacto das visitas na decisão de prescrever e reconhece o representante como fonte de atualização sobre novidades terapêuticas. Estudos qualitativos mostram que o contato é percebido como útil quando focado em evidência clínica, com diferenças culturais entre países. O insight aqui é ajustar a proposta de valor da visita para educação científica, apoio à tomada de decisão e esclarecimento de posicionamento terapêutico. [7,8,9,10]
6) Mensuração e dados.
Bases consolidadas do setor descrevem como mensurar a visitação por canal e prescrição por médico com granularidade temporal suficiente para modelagem. Esses dados viabilizam modelagem de mix de marketing (marketing mix modeling, MMM) e análises quase-experimentais robustas. Relatórios de tendência de campo oferecem referências comparativas de uso de conteúdo, volume de visitas presenciais e virtuais e relação com início de tratamento, insights úteis para calibrar cadência e cobertura. Do ponto de vista analítico, a combinação de dados de campo com séries históricas de prescrição cria um laboratório natural para estimar elasticidades e retorno sobre investimento por segmento e ciclo de vida da marca. [11,13,15]
Síntese dos resultados.
A visitação promocional, quando ancorada em conteúdo científico, mostra associação positiva com prescrição e adoção, com maior sensibilidade em contextos de lançamento e quando o representante usa materiais digitais. O canal remoto pode performar no mesmo nível do presencial, dependendo do tema2. A aceitação médica é relevante e fundamentada no valor informacional do contato. Há espaço para ganhos de produtividade com melhor priorização e mensuração, usando dados padronizados do setor.
[1] Exemplos: “Lançamento em 10 minutos”; Card digital “Critérios de elegibilidade”; Caso clínico interativo; Resumo visual de segurança; Fluxograma terapêutico; Vídeo curto sobre mecanismo de ação; E-mail-resumo pós-visita.
Discussão
Nas decisões de investimento e desenho da força de vendas, devem ser consideradas quatro frentes práticas: segmentação e priorização, conteúdo e narrativa, orquestração de canais e mensuração de valor.
Segmentação e priorização.
Na prática, a produtividade marginal de uma visita depende da probabilidade de resposta do médico e do potencial de volume da classe terapêutica. A evidência de mediação por prioridade e tempo sugere que empresas devem abandonar metas exclusivamente volumétricas e adotar metas ponderadas pelo valor incremental esperado. Isso implica construir escores de propensão à adoção por médico, combinando variáveis como estágio do ciclo de vida da marca, histórico de prescrição por subclasse, proporção do paciente-alvo no consultório e engajamento recente com conteúdo científico. Em lançamentos, a elasticidade é maior, como já descrito. [3]
Conteúdo
Do ponto de vista estratégico, conteúdo técnico alinhado a diretrizes clínicas eleva o coeficiente de conversão da visita. A associação entre uso de material digital e mais inícios de tratamento reforça a necessidade de uma biblioteca de fontes de alta qualidade, com roteiros que conectem evidência a problemas de prática real. Recomenda-se um framework de três camadas: a) Mensagem principal baseada em atributos de performance (eficácia, segurança etc.) com síntese visual de estudos de suporte. B) Diferenciação por perfil de paciente, com algoritmos de decisão e eventuais advertências claras. C) Cards rápidos de objeções frequentes com respostas embasadas. Treinamento recorrente do representante em habilidades de apresentação, bases científicas e de uso do conteúdo em diferentes contextos aumenta a chance de adesão do médico à mensagem. [5,11,12]
Orquestração de canais.
Evidências indicam o maior potencial das estratégias híbridas: visitas presenciais para temas complexos e vínculos relacionais, com contatos remotos para reforços, atualização pós-lançamento e manutenção de cadência. E-mails com materiais científicos e convites para sessões remotas funcionam como touch-points intermediários, reduzindo o tempo entre interações e mantendo a marca no radar do prescritor. O objetivo é maximizar cobertura efetiva com custo unitário menor, sem sacrificar qualidade. A governança desse mix deve respeitar preferências do médico e calendário de consultório, com janelas claras de contato preferencial e conteúdos adaptados ao canal. [6,11,12,14,15].
[2] O remoto funciona melhor quando o tema é objetivo, padronizável e cabe em 10 a 15 minutos, com 1 a 2 materiais de apoio. Ex. Manejo de eventos adversos comuns.
Alinhamento ético e governança.
Processos claros de aprovação de conteúdo, registro de interações e segmentação baseada em potencial. Em mercados da Europa, análises qualitativas apontam tensões regulatórias e, ao mesmo tempo, um racional clínico-informacional para manter visitas sob regras estritas. Isso implica construir um arcabouço de conformidade regulatória que inclua treinamento obrigatório, auditorias e uso de dados para provar que a proposta de valor é educacional e de suporte à decisão. Não se trata de persuadir por incentivos, mas de facilitar acesso a evidência e posicionamento terapêutico. [4,10]
Mensuração e prova de valor.
Para sustentar orçamento é essencial demonstrar impacto incremental. Há três caminhos complementares: a) Experimentos de campo quando viáveis, como escalonamento de cadência entre grupos de médicos comparáveis. B) Desenhos quase-experimentais, como contrastes entre regiões ou instituições com diferentes níveis de de acesso e interação. C) Modelagem de mix de marketing, incorporando séries históricas de visitas por canal, uso de conteúdo e prescrição por médico, com variáveis de controle para concorrência, preço e teor científico do conteúdo. A recomendação é construir um painel médico mensal com 24 a 36 meses, estimar funções de resposta por segmento e validar relações causais. [4,11,13,15]
Operação e capacitação da força de vendas.
Na prática, o ganho de produtividade não virá apenas de mais visitas, e sim de melhores visitas. Isso inclui roteirização de visitas com objetivos claros, preparação prévia com dados do médico, uso disciplinado de material digital, checagem de entendimento e compromisso de próximo passo. O tempo do representante é um ativo escasso. A evidência de mediação pelo tempo de visita recomenda metas de qualidade e não apenas de quantidade. Métricas sugeridas: taxa de uso de conteúdo por visita, tempo médio de exposição à mensagem principal, proporção de visitas com confirmação de entendimento e taxa de follow-up remoto efetivado em até sete dias.
Gestão de portfólio e ciclo de vida.
Em marcas maduras, a elasticidade à visita tende a ser menor e concentrada em subsegmentos específicos. Isso significa criar esteiras de ativação por fase: preparação pré-lançamento com mapeamento de “early-adopters”, foco em educação médica nas primeiras 8 a 12 semanas, e manutenção híbrida com reforços digitais. Em cada fase, monitorar início de tratamento para novos pacientes e novas prescrições por médico ajuda a detectar aceleração, platô e eventual necessidade de reformulação do conteúdo.
Adaptações por país e contexto.
Diferenças de preferência por canal e ritmo de adoção refletem normas culturais e regulatórias. Estudos quantitativos e qualitativos em diferentes regiões indicam nuances de receptividade e utilidade do contato. Estratégias devem ser regionalizadas, partindo de uma base geral de conteúdos, mas com liberdade para adaptação da cadência e do tom às expectativas de cada subgrupo identificado. [7,8,9,10,12,14]
Conclusão
Para decisões de orçamento e execução, a síntese é que a visitação médica, em conformidade regulatória e centrada em conteúdo técnico, tem efeito real sobre a adoção terapêutica e a prescrição.
O efeito é maior quando a operação acerta três pontos: priorização correta, tempo suficiente e uso disciplinado de material digital.
O canal remoto não é inferior por definição e pode ser tão efetivo quanto o presencial para reforço de mensagens, o que permite mix de menor custo unitário sem perda de impacto.
Na prática, o plano de ação inclui segmentação por propensão e potencial, roteiros de conteúdo por perfil de paciente, capacitação contínua da força de vendas, e uma esteira de mensuração que una dados de campo e séries de prescrição por médico.
O sucesso depende de governança ética, com processos que provem o caráter educacional do contato e evitem qualquer prática que possa comprometer a integridade da relação com o médico.
Do ponto de vista estratégico, reforçar a ciência e a utilidade da visita protege a reputação, melhora a experiência do médico e entrega resultados de negócio sustentáveis.
A recomendação final é investir em qualidade de contato, não apenas em quantidade, e institucionalizar a mensuração incremental para que cada ciclo de planejamento comece com evidência e termine com aprendizado aplicável.
Referências
1. Moretti G, et al. A systematic review and meta-analysis of macro, meso and micro determinants of prescribing. Health Policy. 2025. doi:10.1016/j.healthpol.2025.104123.
2. Gittus M, et al. A conceptual model of factors potentially influencing prescribers’ decisions. BMC Med. 2025;23:xx. doi:10.1186/s12916-025-04194-9.
3. Kulkarni GR, Agrahari S, Sen S. Launching a new brand in the multi-brand portfolio: real-world observational study evaluating mediating role of detailing priority and detailing time on physicians’ prescription behavior. Int J Pharm Healthc Mark. 2023;17(3):288-310. doi:10.1108/IJPHM-05-2022-0043.
4. Eisenberg MD, Stone EM, Pittell H, McGinty B. The Impact of Academic Medical Center Policies Restricting Direct-to-Physician Marketing on Opioid Prescribing. Health Aff. 2020;39(6):xx-xx. doi:10.1377/hlthaff.2019.01289.
5. Veeva Systems. Pulse Field Trends Report – Q4 2023. California: Veeva Systems; 2023. Disponível em: https://www.veeva.com/resources/veeva-pulse-field-trends-report-4q23/
6. IQVIA. Channel Impact: can virtual contacts really pick up the slack? IQVIA EMEA Blog; 2021.
7. Altowayan WM, et al. Influence of pharmaceutical representatives on prescription. J Family Med Prim Care. 2022;11(12):xxxx.
8. Al Thabbah DH, et al. The effect of pharma companies’ marketing-mix on physicians’ prescribing in Jordan: a cross-sectional study. BMC Health Serv Res. 2022;22:1293. doi:10.1186/s12913-022-08664-1.
9. Ali KE, et al. The attitude and acceptability towards medical promotional tools and their influence on physicians’ prescribing practices in Jordan and Iraq. 2022. Acesso aberto.
10. Barbaroux A, et al. General practitioners and sales representatives: why are visits so common in France? Front Public Health. 2022;10:xxxx.
11. Veeva Systems. Pulse Field Trends Report – Q4 2024; Q1–Q2 2025. Série de relatórios.
12. Clarivate. Remote and in-person sales reps continue to inform patient care, but physician needs vary. 2022.
13. IQVIA. Available IQVIA Data (ChannelDynamics & Xponent). 2025.
14. IQVIA EMEA. Channel Impact: can virtual contacts really pick up the slack? 2021.
15. Veeva Systems. The New Role of Customer Reference Data in Launch Success. 2023.